28 de fevereiro de 2011

O Vencedor - David O. Russell



Certa vez, num sábado à tarde, estive num churrasco na casa de um amigo com seus familiares, e em determinado momento houve uma pequena discussão entre ele, seu pai e seus irmãos. Em pouco mais de dez minutos muito foi dito e eu, espectador involuntário, vi e ouvi ali, muita dor escondida em pequenas palavras. Essa discussão foi primordial para eu entender esse meu amigo ao longo dos anos, entender suas atitudes e a forma como encara a vida sobre diversos aspectos. Não tem jeito, as marcas guardadas da infância e adolescência são indeletáveis, e nos acompanham, a todos. A família sempre é a grande responsável por tudo que a gente carrega de bom ou ruim, mesmo que certas lembranças estejam guardadas num cantinho da mente, sempre aflora a dor (na maioria das vezes) ou o amor disso tudo. Eu também tenho minhas dores-amores, principalmente por ter uma família pra lá de problemática. Cada pessoa carrega consigo os genes físicos de seus familiares, mas às vezes são os genes emocionais, os que nos emolduram, para o bem ou para o mal. Muitas vezes aquele que diz te amar, te empurra – mesmo sem querer – para o buraco, em meio a cobranças difíceis de serem pagas, pois na verdade não existe formas de pagamento para o afeto sentido ou destruido. Não se sabe cobrar, não se sabe pagar, e muita dor nasce dessa coisa toda. Entre camadas e camadas de dor e amor vai se vivendo em família.

O filme “ O Vencedor” foi crescendo em mim, assim que saí da sessão. E o que mais me tocou no filme foi essa relação familiar conturbada do personagem de Mark Walberg com seus irmãos e sua mãe controladora. Ele, por amor a sua familia, tenta fazer o que seu irmão viciado e ex-pugilista, suas irmãs feias e sem personalidade, e sua mãe controladora esperam dele e com isso vai se apagando para sua própria vida. Se deixa levar por eles, mesmo que com isso perca sua própria identidade. A coisa só começa a mudar quando ele conhece sua namorada e futura esposa, pois essa começa a peitar sua família, chegando até a sair na porrada de fato com as irmãs dele (Deus do céu! Porque uma Amy Adams dessa não aparece na minha vida!) e mostra a ele outro caminho para sua carreira decadente de pugilista. Mas a coisa nunca é fácil, principalmente numa família problemática, e o embate e as cobranças ferem mais que as porradas no ringue.

Mark Walberg está no seu melhor papel, desde Boogie Nights, aceita se “apagar” como estrela do filme, pois seu personagem assim exige, para que os outros ao seu lado brilhem. E como brilham! Cristian Balle está perfeito e no melhor papel de sua vida como viciado, sua atuação é tão boa que talvez seja a premiação mais certa do Oscar deste ano, não tem para ninguém, assim como Amy Adams e Melissa Léo também arrasam como namorada e mãe.Personagens densos, complexos,com várias camadas, que estes três atores em estado de graça nos mostram. Um exemplo dessa complexidade é a cena em que a mãe vai buscar o filho da boca do lixo, quando este esta se drogando e sai literalmente de dentro do lixo, ele entra no carro envergonhado e canta “I Started a Joke” e corta o coração de todos. É a cena do ano!Fora este intrincado jogo de amor e dor familiar, salta aos olhos também as belas cenas de luta e superação no ringue, fora a trilha sonora nota dez.

Um filmaço que deveria ganhar todos os Oscars a que concorre, para mim, de longe o melhor entre os concorrentes neste ano. Já que “Além da Vida” do velho e bom Clint, está inacreditávelmente fora do páreo.

16 de fevereiro de 2011

Dalva e Herivelto - Uma Canção de Amor - Dênis Carvalho/Maria Adelaide Amaral


“Toda vez que eu faço um espetáculo de teatro, um show de teatro. Eu tenho um repertório que eu obedeço desde a estréia até o fim da temporada. E normalmente quando eu volto para minha casa, nos meus dias de folga, eu sempre me pego com um violão cantando músicas não incluídas no repertório de cena. Normalmente são músicas muito românticas, muito apaixonadas, apenas ligadas ao coração. Essas músicas sempre me são lembradas através das gravações da extraordinária Dalva de Oliveira. A Dalva tinha a coragem, o jeito de cantar no palco, o que até então eu só tinha a coragem e jeito de cantar dentro da minha casa – Maria Bethânia – Pássaro da Manhã”



A vida de Dalva e Herivelto pode ser divida como um velho e bom disco de vinil com lado A e lado B.

No lado A do disco, temos o início, uma história alegre, de samba e carnaval, ambos (Dalva dezenove, Herivelto vinte quatro anos) muito novos, novo sucesso, parceria musical e amorosa, em estado de graça. Parceria mais que perfeita, que se fez com o Trio de Ouro, e as mais belas e inspiradas composições de Herivelto. Veio o casamento de ambos e seus dois filhos. Sucesso retumbante na era de ouro da rádio e os famosos cassinos como o da Urca. Mas naquela época em que tudo o homem podia, e nada a mulher, não existia a possibilidade de separação entre casais. Dalva começou a quebrar estes paradigmas com seu ciúme pelas escapadas de Herivelto, e não se furtava a comentá-las aos amigos ou a quem quisesse saber (“Seu mal é comentar o passado/ Ninguém precisa saber o que houve entre nós dois/ Não deixe que males pequeninos/ Venham transformar nossos destinos”), e a desarmonia começou a ruir a parceria de ouro das rádios cariocas. O fim do casamento era inevitável, até que aconteceu Lurdes na vida dele (“Eu amanheço pensando em ti/ Eu anoiteço pensando em ti/ Eu não te esqueço/ É dia e noite pensando em ti”) e o casamento desmoronou, assim como a parceria de ambos. Um acontecimento sem precedentes para a época (“ Tudo acabado entre nós/ Já não há mais nada/ Nosso apartamento agora fica à meia luz/ Nosso apartamento agora já não me seduz”). Verdadeiro escândalo artístico e social. Mas não ficou só nisso, e daí surgiu o lado B da história, em que ambos começaram a se destratarem publicamente, respondendo um ao outro através de músicas, ou através da imprensa. Pode-se dizer que eles iniciaram com o escândalo de ambos, essa indústria da fofoca através da imprensa escrita, que povoam tanto nossos noticiários atuais.

Este lado B foi de longe o mais dramático, pois Herivelto se viu sem sua musa inspiradora e começou a atacá-la em suas composições – afinal ele podia, mas ela não - pois ela devolvia com a mesma moeda suas traições (“Errei sim, manchei o seu nome/ Mas foste tu o culpado/Deixavas-me em casa/ Me trocando pela orgia/Me faltando sempre com a sua companhia... Mas se existe ainda alguém que queira me condenar/Que venha logo a primeira pedra atirar”). O público não jogou pedra alguma, muito pelo contrário. Dalva despontou para um sucesso maior ainda do que com o Trio de Ouro. Mas seu sucesso acontecia por ela sangrar, se rasgar, se mostrar como até então cantora alguma havia se mostrado em público, suas dores eram expostas sem nenhuma vergonha ou pudor pela perda de Herivelto, seu grande amor. Quanto mais sucesso, mais dor de cotovelo. Nesta época Dalva se tornou a maior cantora brasileira. Seus shows eram declarações públicas de dor e sofrimento por amar demais. Tanto, que virou musa inspiradora para as grandes cantoras que viriam a seguir, como Bethania descreve no texto acima. Mas também viu sua carreira começar a entrar no esquecimento com o advento da televisão e principalmente da Bossa Nova. A música de fossa já não agradava mais ao grande público e Dalva foi amargamente envelhecendo, casando, descasando e se embebedando, fazendo shows em lugares não condizentes com sua estrela antiga.

Tudo isso é retratado com maestria na minissérie que a Rede Globo apresentou ao público no ano passado. Foi de longe, o melhor programa exibido no ano de 2010 na TV aberta, e por que não dizer, da fechada também. Pois apesar da rica vida dos dois personagens centrais, é de ficar de queixo caído o retrato de época feito por Denis Carvalho e sua equipe. Um verdadeiro respeito com o público, mostrando que se pode (ainda) conciliar o belo e o popular. E se os cenários e figurinos ficaram soberbos, o que falar então dos atores, desde os coadjuvantes aos seus dois atores principais. Adriana Esteves está perfeita, e comove principalmente quando interpreta Dalva velha e decadente. Já Fábio Assumpção está em seu melhor desempenho na televisão e convence perfeitamente, em todos os momentos, chega a ser surpreendente. Uma cena que chama a atenção é quando Pery vai chamar o pai para visitar a mãe que está nas últimas no hospital e este se nega. Fábio Assumpção passa num olhar longo e profundo toda a dimensão de um homem que fez suas escolhas de acordo com sua época. Afinal Herivelto Martins não foi nem um mocinho e nem um vilão, e cumpriu com suas escolhas, fossem certas ou erradas, mas viveu conforme sua época.

Recomendo à quem não assistiu na TV, que compre, roube, pirateie, baixe. Mas assista. Eu até gostei mais agora, na segunda vez, quando assisti tudo de uma vez. Sem dúvida, o melhor da TV no ano passado.

2 de fevereiro de 2011

OS MELHORES FILMES DE 2010

Todo ano participo da votação da liga dos blogues cinematográficos sobre os  melhores do ano que passou. Já com o voto enviado e atrasado, mostro abaixo quais foram os meus votos com a liberdade de indicar meus dez filmes preferidos do ano passado. Um ano relativamente fraco, com poucos filmes acima da média. O que salvou o ano foram as espetaculares mostras de Yasujiro Ozu e do mestre John Ford, ambas no CCBB de São Paulo e as séries americanas. E o ano já começa sombrio com o velório do Belas Artes, mas espero que este ano que se inicia seja melhor.





FILME
  1. Tropa de Elite II – José Padilha
  2. Vincere – Marco Bellocchio
  3. Tudo Pode dar Certo – Wood Allen
  4. Antes Que O Mundo Acabe – Ana Luiza Azevedo
  5. Você Vai Conhecer o Homem dos Seus Sonhos – Wood Allen
  6. O Segredo dos Seus Olhos – Juan José Campanella
  7. Minhas Mães e Meu Pai – Lisa Cholodenko
  8. O Escritor Fantasma – Roman Polanski
  9. Ilha do Medo – Martin Scorsese
  10. Coração Louco – Scott Cooper


DIRETOR

  1. José Padilha – Tropa de Elite II
  2. Marco Bellocchio – Vincere
  3. Wood Allen – Tudo Pode Dar Certo
  4. Roman Polanski – O Escritor Fantasma
  5. Juan José Campanella – O Segredo dos Seus Olhos

ATOR 
  1. Jeff Brigdes – Coração Louco
  2. Marco Nannini – A Suprema Felicidade
  3. Wagner Moura – Tropa de Elite II
  4. Ricardo Darín – O Segredo dos Seus Olhos
  5. Antonio Gassala – Dois Irmãos


ATRIZ
  1. Giovanna Mizzogiorno – Vincere
  2. Annette Bening – Minhas Mães e Meu Pai
  3. Abby Cornish – Brilho de Uma Paixão
  4. Graciela Borges – Dois Irmãos


ATOR COADJUVANTE
  1. Filippo Timi – Vincere
  2. André Matos – Tropa de Elite II
  3. Irandhir Santos – Tropa de Elite II
  4. Guillermo Francella – O Segredo dos Seus Olhos
  5. Marck Ruffallo – Minhas Mães e Meu Pai


ATRIZ COADJUVANTE
  1. Gemma Jones – Você Vai Conhecer O Homem dos Seus Sonhos
  2. Kin Catroll – O Escritor Fantasma
  3. Helena Bronham Carter – Alice
  4. Soledad Villamil – O Segredo dos Seus Olhos
  5. Mo´nique – Preciosa


ELENCO  DE 2010
  1. Tropa de Elite II
  2. Tudo Pode Dar Certo
  3. Você Vai Conhecer o Homem dos Seus Sonhos
  4. Os Inquilinos
  5. Ilha do Medo


MELHOR CENA DO ANO 2010

  1. Mussolini filho imita Mussolini pai – Vincere
  2. Tomada de estádio – O Segredo dos Seus Olhos
  3. Brincadeira Final – Toy Story III
  4. Discurso no congresso do Cap. Nascimento – Tropa de Elite II
  5. Os fios de cabelo e a volta à mesa – Minhas Mães e Meu Pai


FILME BRASILEIRO
  1. Tropa de Elite II – José Padilha
  2. Antes Que o Mundo Acabe – Ana Luiza Azevedo
  3. Os Inquilinos – Sergio Bianchi
  4. Como Esquecer – Malu de Martino
  5. As Melhores Coisas do Mundo – Laís Bodanski


FOTOGRAFIA



  1. Vincere – Marco Bellocchio
  2. Tetro – Francis Ford Coppolla
  3. A Fita Branca – Michael Heneke
  4. A Ilha do Medo – Martin Scorsese
  5. A Origem – Chistopher Nolan


O PIOR FILME DE 2010 
  1. Sex And City II – Michaes Patrick King
  2. Ninne – Rob Marshall
  3. Cadê os Morgan? – Mark Lawrence
  4. 400 Contra 1 – Cacco Souza
  5. O Bem Amado – Guel Arraes