26 de outubro de 2012

Aquele Querido Mês de Agosto – Miguel Soares



“Não é a toa que eles estão na crise que estão”. “Bem feito, agora eles que tiram piadas de nós, mandando um filme desses para a gente ver”. Frases escutadas, assim que o filme acabou. Cine Olido, Mostra, centro da cidade, preço popular.  Acho que não assistimos ao mesmo filme, pois eu estava besta com tamanho filme. Um filme imenso, deslumbrante. E a pergunta é: Como descrever um filme assim? Não sei... Eu que já vi todo tipo de filme, acho que talvez só Don Sebastião quando voltar de suas conquistas por mares  nunca  antes navegados, é que vai poder responder esta questão.
Como posso achar deslumbrante um filme que no começo me fez cochilar e até pensar em desistir de assisti-lo, como alias fizeram, mais que a metade da sala, que no inicio estava lotada? Documentário? Ficção? Cochilo? Deslumbre? Onde começa um e termina o outro? Um filme dentro de outro filme? Um documentário falso ou uma ficção real? Só sei que indico este filme para todas as pessoas que querem ver algo realmente diferente no cinema. O melhor mesmo é nem tentar decifrar, e apenas adentrar por este interior imenso das terras lusitanas. Em pensar que ainda tem outros dois filmes (“TABU” e “A Cara Que Mereces”) do mesmo diretor na Mostra.
O filme começa com um radialista narrando a visita da equipe de filmagens de “Aquele Querido Mês de Agosto” em sua rádio. Esta equipe percorre todo o interior do país filmando os festejos que acontecem sempre no mês de agosto, que é quando em pleno verão, as pessoas voltam do centro econômico e cultural do país, para visitarem seus parentes e suas terras da infância, aproveitando para curtir o calor do mês, sendo que o resto do ano é aquele frio europeu. Fica entendido e vemos isso acontecer mais ainda no final do filme, que a equipe do filme está inserida em todo contexto da história. Só o dialogo do diretor de som com o diretor do filme nos créditos finais já vale o filme.
Nestes lugares acontecem festas folclóricas com muita música popular (brega, se fosse por aqui), dança e comidas típicas. A tradição religiosa, a vida simples das comunidades é mostrada de forma simples, sem grandes arroubos, de forma singela. É a parte claramente  documental, que certamente causa estranheza –  (“afasto o que não conheço”), mas sem que se perceba, vai mudando seu contexto para outra coisa e vai nos ganhando. O ponto central é quando o diretor conversa com o produtor, para ele ir buscar mais dinheiro na capital, e que ele encontrará os atores para a história que pretende contar, tendo como ponto de partida um triangulo amoroso e incestuoso (será?) entre pai, filha e primo. Será que são atores de verdade? Será que aquilo tudo realmente aconteceu? Ou é tudo invenção?  Quando vemos, estamos como que por mágica, totalmente envolvidos na história desta família, que vive a sair pelas cidades do interior a cantar nas tais festas populares. Mas não só com esta família, mas com todos aqueles personagens (?!) e aquelas paisagens, fazendo um grande quadro imenso de um filme grandioso.
Daí o arrependimento de ter cochilado por poucos minutos. De ter cometido a heresia de pensar em ir embora, pois tudo ali se completa num quadro imenso de um cineasta em pleno domínio do que quer mostrar e que encanta. Algo que não sei explicar, novo, inquietante, que eu apenas um espectador,  não sei explicar. Mas quem disse que tudo tem que ser explicado? Melhor é ser mágico, ser poeta. E Miguel Soares se mostra diferenciado da nova safra de cineastas. Faz mágica e poesia na tela.

24 de outubro de 2012

Procura-se Um Amigo Para o Fim do Mundo – Lorene Scafaria



“Esta tudo acabando, vamos morrer”
“Pois eu nunca me senti mais vivo”
Termina o filme e fico colado, sensível, pequeno, na poltrona do cinema. O mundo acabou de acabar no filme e nunca vi pessoas tão vivas, mas só duas. A cena final, a música linda, linda (This Guy´s In Love With You- Herb Alpert) que toca em seguida, nos letreiros, me enche o peito de uma espécie de angústia, daquela saudade do que não vivi. Impressionante, como em certos momentos, seja para o bem ou para o mal, alguns filmes mexem tanto com a gente. Para compensar o mal estar gerado por “Cosmópolis”, um pesadelo de duas horas.  Eu saí do cinema com a sensação gostosa de que a vida vale a pena, nem que seja só por aquele momento singelo, aquela ultima cena. Duas pessoas, o amor (coisa mais cafona, ainda existe isso?), tomando conta de tudo, e aquele sonhado conforto, que não se abala nem pelo eminente fim do mundo. Não existe mundo, existem dois rostos se entreolhando, existe o amor no ar. Pra que mais? Como você gostaria de passar seus últimos momentos? Eu queria daquele jeitinho. Dois ursinhos, de pelúcia? Não. Apenas Dodge e Penny sorrindo, se bastando.
“Quero injetar heroína e escutar Radiohead” diz um dos personagens em meio uma das várias festas, regadas a excessos. Já que tudo vai acabar mesmo, para que pudor? Enquanto uns resolvem abusar através das orgias, dos vícios e outras loucuras, vou sendo conquistado aos poucos pelos personagens de Steve Carell e Keira Knighttey, dois vizinhos que se encontram, quando falta apenas três semanas para o mundo acabar. Ela, extrovertida, depois de terminar um namoro, quer apenas encontrar sua família antes da morte, e ele introvertido, abandonado pela esposa, deseja encontrar uma ex-namorada dos tempos de colégio.  O fim do mundo é apenas uma consequência da vida para eles, e o importante mesmo é ir atrás do que realmente interessa, no tempo que é possível. Ir atrás daquele momento único, que não tem preço, a procura até o fim daquele afeto sonhado.
Talvez o filme não tenha agradado a muitos, justamente naquilo que ele mais me agradou, o fim é apenas um meio, e tratado como pano de fundo, para o encontro daquelas duas almas tão distantes, mas que pelo destino fatal, acabam se juntando, se encontrando um no outro. A tragédia é para os outros. E a coisa nunca vira um melodrama meloso, tudo é mostrado de forma despretensiosa, mesmo em outras cenas lindas, como quando o jornalista encerra as transmissões na tv e diz que vai passar os últimos momentos com a família, ou mesmo na cena linda em que Dodge se despede de Penny e coloca sua gaita de estimação no seu colo. Também a serenidade das pessoas na praia em comunhão celebrando o que viveram e com os quais estavam, ao invés do desespero, uma ode a natureza tão bela. Pequenos trechos de afeto, que se encontram esquecidos num mundo de banalidades, onde os valores se perderam. Não nos reconhecemos mais? Deus não nos reconhece mais?
Em todo o caminho dos dois, Penny segue carregando seus vinis de estimação, fazendo eu me lembrar da burrada que fiz, me desfazendo dos meus há muito tempo atrás, me fez lembrar o quanto era delicioso sentir e vivenciar aquele bonachão nas mãos. A nova geração não sabe o quanto isto era bom, deu para relembrar as várias vezes em que, assim como Dodge, eu me deitava no chão com aquele vinil encostado no peito a sonhar  ou a sofrer por um novo/velho amor não correspondido. A trilha sonora, recheada de canções de amor dos anos sessenta e setenta é um personagem à parte, é tão boa, que já vale o filme.
De mulherzinha? Não, de jeito nenhum. Apenas uma lembrança de que uma mão na mão é mais, muito mais do que a fúria louca das orbes ocas e modernas. Talvez eu não tenha sido feito para estes tempo. Talvez um pouco sensível. Só sei que adorei o filme e recomendo. Sonhando com aquele olhar da Penny da cena final, muito diferente do olhar de Kirsten Dunst no outro filme "Melancolia" em que a temática também se faz em torno do eminente fim do mundo. Mas aí já é um filme bem maior em todos os sentidos. Entre o fim dos mundos de ambos, prefiro o mais singelo, e de preferencia, ao som de um vinil antigo.