Geralmente os filmes de Wood Allen nos chegam com grande atraso por causa das distribuidoras. Como exemplo, temos “A Prova de Morte” filme de Tarantino, que chegou aqui com três anos de atraso. Fantástico, não? Sendo assim, acabamos por receber dois filmes de Allen no mesmo ano. Isso acabou sendo bom, pois no começo do ano me deparei com “Tudo Pode Dar Certo”, filmaço do velho mestre, já na lista dos melhores do ano, como há tempos não acontecia.
Essa última comédia relembra Allen na sua melhor forma. Talvez, desde “Desconstruindo Harry”, ele não fazia um filme tão bom. Texto afiado, grandes piadas em série que às vezes fica até difícil acompanhar a velocidade, e aquele seu jeito todo peculiar de filmar, meio até displicente, que acaba tendo aquele charme que só ele consegue, relembrando seus bons tempos, nos idos dos anos 80 e começo de 90, quando era sem dúvida meu diretor favorito.
Eis que, para minha surpresa, no final do ano, aparece outro filme do mestre. Mas com outra pegada, outro ritmo. Na minha modesta opinião “Você Vai Conhecer o Homem dos Seus Sonhos” é vendido erroneamente por aí, parece até uma pegadinha de Allen, para os desavisados. Não existe comédia ali, - talvez alguns sorrisos amarelos- todas as personagens estão à beira do precipício, perdidos em suas vidas. Um pé dentro, outro fora do abismo. Não é uma comédia e sim uma tragédia. Indo na direção contrária ao filme do começo do ano, bem poderia se chamar “Tudo Pode Dar Errado”.
Fui rever outro dia, em minha lenta e dolorosa despedida do cine Belas Artes e um casal à minha frente estava em dúvida sobre qual filme assistir. Um falou ao outro em assistir a este filme, pois queriam se divertir. Deu vontade na hora de falar-lhes que não fossem, pois iriam se arrepender. Certamente, eles devem hoje fazer coro aos muitos que não gostaram do filme, como tenho lido por aí.
Se não me engano, foi no blog do Chico, que li uma crítica ao filme dizendo que os atores estavam inadequados aos seus papéis. Ele até faz comparações com os atores de Hanna e Suas Irmãs. Pois é justamente neste citado erro é que esta o grande acerto do filme. Todos os atores – com exceção ao personagem de Antonio Bandeiras, que parece ser o único a não estar na beira do precipício – não se encaixam com seus personagens. É a inadequação de cada um consigo mesmo, que rege a vida de um por um ali. Maus atores de suas vidas reais. Um bom exemplo é o personagem de Naomi Watts- que arrasa justamente por parecer a mais perdida – que abandona o marido por estar apaixonada pelo patrão e se achar correspondida. Ela recua quando tem que avançar, ou avança quando tem que recuar. Eu bem sei o que é isso, ou se sei!
Allen chega até a brincar – tristemente – com o espiritismo, pois uma de suas personagens, a ótima Gemma Jones, resolve adentrar neste desconhecido mundo a fim de afastar a todo custo a solidão na velhice. Enquanto isso, seu ex-marido, vivido por Anthony Hopkins, resolve rejuvenescer artificialmente, iludido, atrás do tempo perdido, através de pílulas azuis e um novo casamento fadado ao fracasso.
Acho que a personagem que mais me tocou foi a indiana (Freida Pinto) que se envolve com o escritor ladrão e medíocre, vivido por Josh Brolin. Não pelo o que é mostrado no filme, quando ela abre mão de um casamento e dos costumes milenares e familiares, para ficar com ele. Mas pelo que sabemos que acontecerá a ela quando aquele seu castelo de areia certamente cair. Não vemos isso no filme, mas sabemos que fatalmente acontecerá. O filme não acaba ali, muita tristeza e fracasso virão para eles, por suas escolhas errôneas. Onde está a comédia disso tudo? Parece que Wood Allen está atrás da câmera pintado de palhaço triste. Aquelas pessoas estão por aí, passam por nós, estão na fila de cinema, no supermercado, estão em mim, inadequado até os ossos. Tentando por um momento, um pouquinho só que seja se encontrar, na ilusão de ser feliz, e quem sabe retirar a mascara de palhaço triste.