20 de abril de 2012

Shame - Steve McQueen



Alguma coisa está errada, muito errada. Saiu do cinema com uma sensação esquisita, noite de domingo é um porre, última sessão e apesar do calor intenso do lado de fora do carro, é frio na minha alma. Faz tempo que não escrevo no blog, nem mesmo sei ao certo dizer o porquê do recesso, como tantas outras coisas que sei menos ainda, e essa sensação ruim no peito. Queria escrever coisas alegres, depois de tanto tempo. Dizer, escrever, gritar que a vida é boa! Mas é que de fato este filme me causou um desconforto muito grande. Inadequação, esta deve ser a palavra. Inadequação dos personagens, inadequação minha para com a vida. Será? É nisso que nos ligamos eu, Brandon (Michael Fassbender) e Sissy (Carey Mulligan). Cada um a seu modo, desafinando o coral dos contentes. Mas me desculpem, tenho esta mania de me personificar no drama.
O que acontece com certas pessoas que tem tudo (bom trabalho, casa, beleza e conforto) para se enquadrar e viver de acordo com os ditames sociais, mas não consegue? Michael só consegue se perfazer no jorro da sua porra, seu vício é o sexo, sem carinho, sem afeto, como num filme gonzo terrível de sexo explicito. Alias, quem conseguiria assistir um filminho desses e ao mesmo tempo se alimentar de  um delicioso almoço ou jantar, hein? Sua vida consiste em se acabar e se consumir através do sexo, seja com uma garota abordada na rua , seja na punheta no banheiro do serviço, ou seja, com a garota de programa a domicilio, tudo é uma consumação desmedida de si mesmo, através do sexo, que como vemos no decorrer do filme, nem chega a ser mais um prazer, mas sim uma compulsão, o prazer que virou dor. A banalização do sexo fácil nestes tempos modernos. O que era para ser lúdico e inesquecível vira esmola vulgar de um corpo qualquer. Na única vez que vemos tentar se relacionar - em duas cenas memoráveis- com uma colega de trabalho, sua libido se esconde. Afeto e sexo não se misturam em sua vida.
Eis que um dia surge sua irmã querendo conviver com Michael, querendo conquista-lo, e tenta invadir seu espaço. Interessante notar, que ambos nos são apresentados nus, cada qual a seu tempo, e cada nudez tem sua forma de se interpretar, a dele é viril e a dela é a fragilidade. Talvez seja o personagem dela, o que mais me fascina. Ela é o contrário do irmão, pois é dependente de afeto, de carinho. Ele é só sexo, ela é carência levada às últimas consequências. É uma daquelas pessoas que necessitam o tempo todo de atenção e mimo, que não conseguem de maneira nenhuma aguentar a solidão. Seu personagem – para mim- é mais comum e fácil de se encontrar por aí. Eu mesmo tenho uma amiga mais velha e que não vejo há tempos que é assim, não consegue ficar só, e quando fica se apaixona (mesmo!) pela primeira pessoa que ela julga disponível e vai à luta. Lembro de uma vez que ela tentou se matar depois de um dos muitos abandonos que sofreu, eu era muito jovem e não conseguia entender aquilo, aquela história de pílulas, aquelas crises. Mas de certa forma, acho que até senti um pouco de inveja deste jeito de ser, de se jogar para a vida, eu mesmo fui pedido (desesperadamente) em namoro por ela, tudo muito louco. É a solidão destas cidades grandes, que levam as pessoas aos estremos que são capazes. Parece que esta tudo certo, mas não esta, são apenas sorrisos amarelos de aparente sucesso.
O embate entre os irmãos é frequente, só em um momento eles parecem se encontrar que é quando Sissy se apresenta numa boate e canta “New York, New York” de uma forma tão singular que lágrimas do homem – e de quem assiste ao filme - sem alma brotam quase sem querer. A cena por si só já vale o filme e deve ser uma das cenas do ano. Imagine “Aquarela do Brasil” ou mesmo “O Que é, o Que é” viradas do avesso, aquelas palavras ufanistas, alegres a serviço da tristeza, da inadequação, da derrota. Um achado poético.
Depois do filme desço a baixo Augusta, pensando nos dois personagens tão fascinantes e me questionando o porquê de me perturbarem tanto. Olho a rua e me lembro de que até algum tempo atrás a Rua Augusta era povoada de prostitutas e me pergunto aonde elas foram parar? Preferia a Augusta de antigamente, me parecia mais real. Agora a rua está tomada de jovens, bem jovens, meninos e menininhas moderninhas que não me agradam, assim como sei que eu não as agradaria. Volta pra casa escandalosamente só, sem o sexo que Brandon tanto precisa e sem o cafuné que Sissy tanto precisa. Ou será que sou eu que preciso?  

5 comentários:

  1. Porra Betão! Tava com saudade de vc. Não some não. Teu texto, como de praxe, sensacional. Shame é um dos melhores filmes dos últimos anos. Fiquei sentido com o filme tb. Acho q vc nem conhece meu novo espaço. Apareça!

    http://espectadorvoraz.blogspot.com.br/

    Grande Abraço!

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  2. Grande Celo!
    Você que pensa, tenho acompanhado sempre seu novo blog, mas prometo dar meus pitacos lá também. Voltei para ficar, hehehe.Valeu pelo elogio. Incentiva outros textos, né.

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  3. Cara, que bom que você está de volta!! Onde você esteve? A viagem foi boa? :)

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  4. É bom estar de volta, espero que para ficar. As vezes viajamos muito, mesmo sem sair do lugar, não é verdade, hehehe?

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  5. Sim, sim.. Mas eu já passei dessa fase psicodélica. heheh

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