“Esta tudo acabando, vamos morrer”
“Pois eu nunca me senti mais vivo”
Termina o filme e fico colado, sensível, pequeno, na
poltrona do cinema. O mundo acabou de acabar no filme e nunca vi pessoas tão
vivas, mas só duas. A cena final, a música linda, linda (This Guy´s In Love
With You- Herb Alpert) que toca em seguida, nos letreiros, me enche o peito de
uma espécie de angústia, daquela saudade do que não vivi. Impressionante, como
em certos momentos, seja para o bem ou para o mal, alguns filmes mexem tanto
com a gente. Para compensar o mal estar gerado por “Cosmópolis”, um pesadelo de
duas horas. Eu saí do cinema com a
sensação gostosa de que a vida vale a pena, nem que seja só por aquele momento
singelo, aquela ultima cena. Duas pessoas, o amor (coisa mais cafona, ainda
existe isso?), tomando conta de tudo, e aquele sonhado conforto, que não se
abala nem pelo eminente fim do mundo. Não existe mundo, existem dois rostos se
entreolhando, existe o amor no ar. Pra que mais? Como você gostaria de passar
seus últimos momentos? Eu queria daquele jeitinho. Dois ursinhos, de pelúcia?
Não. Apenas Dodge e Penny sorrindo, se bastando.
“Quero injetar heroína e escutar Radiohead” diz um dos
personagens em meio uma das várias festas, regadas a excessos. Já que tudo vai
acabar mesmo, para que pudor? Enquanto uns resolvem abusar através das orgias,
dos vícios e outras loucuras, vou sendo conquistado aos poucos pelos
personagens de Steve Carell e Keira Knighttey, dois vizinhos que se encontram,
quando falta apenas três semanas para o mundo acabar. Ela, extrovertida, depois
de terminar um namoro, quer apenas encontrar sua família antes da morte, e ele
introvertido, abandonado pela esposa, deseja encontrar uma ex-namorada dos
tempos de colégio. O fim do mundo é
apenas uma consequência da vida para eles, e o importante mesmo é ir atrás do
que realmente interessa, no tempo que é possível. Ir atrás daquele momento
único, que não tem preço, a procura até o fim daquele afeto sonhado.
Talvez o filme não tenha agradado a muitos, justamente
naquilo que ele mais me agradou, o fim é apenas um meio, e tratado como pano de
fundo, para o encontro daquelas duas almas tão distantes, mas que pelo destino
fatal, acabam se juntando, se encontrando um no outro. A tragédia é para os
outros. E a coisa nunca vira um melodrama meloso, tudo é mostrado de forma
despretensiosa, mesmo em outras cenas lindas, como quando o jornalista encerra
as transmissões na tv e diz que vai passar os últimos momentos com a família,
ou mesmo na cena linda em que Dodge se despede de Penny e coloca sua gaita de
estimação no seu colo. Também a serenidade das pessoas na praia em comunhão
celebrando o que viveram e com os quais estavam, ao invés do desespero, uma ode
a natureza tão bela. Pequenos trechos de afeto, que se encontram esquecidos num
mundo de banalidades, onde os valores se perderam. Não nos reconhecemos mais?
Deus não nos reconhece mais?
Em todo o caminho dos dois, Penny segue carregando seus vinis
de estimação, fazendo eu me lembrar da burrada que fiz, me desfazendo dos meus há
muito tempo atrás, me fez lembrar o quanto era delicioso sentir e vivenciar
aquele bonachão nas mãos. A nova geração não sabe o quanto isto era bom, deu
para relembrar as várias vezes em que, assim como Dodge, eu me deitava no chão
com aquele vinil encostado no peito a sonhar ou a sofrer por um novo/velho amor não
correspondido. A trilha sonora, recheada de canções de amor dos anos sessenta e
setenta é um personagem à parte, é tão boa, que já vale o filme.
De mulherzinha? Não, de jeito nenhum. Apenas uma lembrança
de que uma mão na mão é mais, muito mais do que a fúria louca das orbes ocas e
modernas. Talvez eu não tenha sido feito para estes tempo. Talvez um pouco
sensível. Só sei que adorei o filme e recomendo. Sonhando com aquele olhar da
Penny da cena final, muito diferente do olhar de Kirsten Dunst no outro filme "Melancolia"
em que a temática também se faz em torno do eminente fim do mundo. Mas aí já é
um filme bem maior em todos os sentidos. Entre o fim dos mundos de ambos,
prefiro o mais singelo, e de preferencia, ao som de um vinil antigo.
Beleza de texto, Beto. Sempre com a emoção à flor da pele. Mas vc não gostou de COSMÓPOLIS?
ResponderExcluirClaro que sim, o filme é ótimo, mas como os filmes anteriores dele (fora os três últimos), ficou aquela sensação de ter entrado num pesadelo.De até sair do cinema me sentindo por vezes mal fisicamente. Coisas de Cronenberg. Obrigado pelo elogio.
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