16 de janeiro de 2007

Anjos do Sol – Rudi Lagemann


Logo percebi no início do filme, que estaria entrando num pesadelo. Logo de cara, vemos o personagem de Chico Diaz e a primeira impressão é a de repulsa (mérito do grande ator), por pessoa tão asquerosa. Ele segue num barco atrás de mais uma “mercadoria” nos confins do sertão miserável. Chega em uma humilde casa e compra Maria (Fernanda Carvalho), do próprio pai. Se a coisa parece ruim, vai ficar ainda pior. Chega a ser inacreditável que tais acontecimentos sejam baseados em histórias reais. Aquilo sim é o terror, pois o que Maria e outras meninas - todas entre dez e doze anos – começam a passar é pior do que qualquer ritual de tortura. A morte seria alívio.

Maria não sabe nada da vida, acostumada a viver no meio da nada e sem nada para comer ou aprender, não sabe se é uma mulher, ou pior, o que vem a ser uma mulher. Nem se despede da família. Segue o homem, que a leva para um leilão, onde ela é comprada, como um animal, por senhores engravatados. Otavio Augusto compra Maria, juntamente com outra menina (Bianca Comparato), pela pechincha de R$ 2.500,00. Serve-se delas e manda para o meio da mata, para um prostíbulo comandado por Antonio Calloni. Se a coisa estava ruim, fica pior ainda. Elas virão prisioneiras, sem ter para onde fugir, e são estupradas várias vezes ao dia, juntamente com outras meninas, que foram parar no lugar da mesma forma. Não acredito que exista crime mais horrível.

É dilacerante a cena em que vemos as meninas sendo estupradas continuamente, e tentam fugir, com ânsias de vômito, por repulsa de homens tão asquerosos. Ou mesmo quando Maria não consegue levantar da cama, por tanta dor que sente em suas partes íntimas. Pior é quando sua colega de desgraça é amarrada no caminhão para ser castigada e servir de exemplo para as outras meninas. Seu último olhar para Maria, naquele momento da eminência da morte, não saí da minha cabeça.

Este filme ficou pouco tempo nos cinemas. Lembro que não foi muito bem recebido pela crítica. Até entendo o porque do não sucesso do filme, pois ele é realmente um baita soco no estômago. Um filme denúncia, e acho que isto é que fez os críticos não gostarem do filme. Mas parabenizo o diretor pela coragem de tocar em um assunto tão monstruoso e delicado ao mesmo tempo. Alguém tinha que faze-lo.

Não acredito que exista coisa pior no mundo, do que o que estas meninas passam. E que este comercio continua pelo Brasil afora, e não vemos nenhuma ação do governo para acabar com esta barbaridade. É revoltante!

Interessante assistir aos extras do DVD, o diretor contando a dificuldade de passar toda aquela intensidade para as meninas atrizes. Por exemplo, como falar sobre penetração e estupro para crianças que (num mundo normal), como a protagonista, nunca tinham ouvido certas palavras como estupro.

Vendo o silêncio das autoridades e público perante tal vergonha brasileira, me pergunto se não somos todos culpados pela desgraça dessas Marias coitadas. E me pergunto quantas meninas estão neste exato momento perdendo sua inocência, seu corpo e sua alma, sem ter alguém a quem pedir socorro. Que mundo é esse, Deus meu!

Um comentário:

  1. Beto, vi esse filme recentemente, apesar do seu post já ser um tanto antigo.

    Acho que todos que viram o filme sentiram a mesma revolta e ficaram torcendo pela Maria, que ela conseguisse fugir de lá e encontrasse um caminho na vida. Mas não é isso que acontece nem na vida real nem na ficção...

    O rosto da menina amarrada no caminhão também foi muito impressionante, acho que foi uma das cenas mais chocantes. Simplesmente horrível.

    O que choca mais é a impunidade, as pessoas olhando e ninguém sente o mínimo de compaixão. Ver um outro ser humano ser assassinado e pensar que aquilo é normal.

    Bom, talvez seja mais um documentário que um filme, eu encarei assim. Mas me prendeu a atenção até o fim porque queria saber como iria terminar, então achei o filme bom. Quando saiu eu não fiquei sabendo sobre as críticas.

    Abraço

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