“A saudade é arrumar o quarto do filho que já morreu...” (Pedaço de Mim – C. Buarque)
Vou contar uma história muito minha e de outros que sofreram comigo a perda, só que bem mais, bem sei. Já se passaram alguns anos, mas os revi não faz muito tempo, e daí foi como se fossem apenas alguns dias, a dor estava lá, o corte e a alma ferida, apenas o tempo como alívio para o sangramento da alma. A falta do filho querido, amigo e muito amado, ali, pesando nos ombros daqueles dois velhos simpáticos, mas tristes. Apesar de sofrer a mesma perda que eles, pois amava e também estava perdendo aquele homem lindo de alma, não têm comparação com a perda deles, com a perda do filho para o câncer. Vindos do interior, de um sítio e seus costumes antigos, se ariscavam nessa louca cidade de vez em quando, por amor ao filho. Até que teve a última viagem, a doença terminal, a morte, ou melhor, o desencarne. Mas foi penoso acompanhá-los na dor. A mãe inconsolável, que mesmo viva, morreu também um pouco, tentando ficar em pé. O pai muito certo e ciente das obrigações do momento, uma fortaleza de resignação. Mas teve aquele momento que eu presenciei que foi sintomática daquela situação toda e ficará comigo pra sempre. Foi quando ele pediu apenas uma lembrança pra si do filho: sua caixa de pescaria. Ao pegar aquele objeto, tão bem cuidado, pois era o passatempo preferido do filho, que adorava pescar, ele deu um grande suspiro de dor, que até então estava guardado no peito. Seu suspiro e seus olhos marejados olhando para aquela caixa não me saem da memória, tamanha dor que eu ali presenciava. É desumano perder um filho, uma coisa que não podia acontecer. Duvido que haja dor maior a qualquer ser humano, duvido.
Daí, a dificuldade do tema proposto neste filme de J. C. Mitchell, a perda de um filho. Tema forte e difícil. Afinal, este é um assunto prá lá de tortuoso, até para quem não tem filhos, mas o mínimo de sensibilidade. Conta a história de um casal que vivia uma vida perfeita, mas o sonho acabou a partir do momento em que o filho foi atropelado em frente à própria casa. Como juntar os cacos? Mas não dá pra se fazer uma coisa dessas, já que não se recupera um órgão ou uma parte qualquer do corpo que se perdeu. Assim, vemos como se comporta este casal oito meses após a tragédia. A ajuda dos parentes e amigos próximos.
Tão infeliz quanto a história deles, é o título que deram ao filme aqui no Brasil. Afinal, quem são estes imbecis que conseguem a proeza de dar títulos aos filmes estrangeiros, é uma coisa de louco. Becca (Nicole Kidman) e Howie ( Aaron Eckhart) não estão reencontrando a felicidade, pois na verdade, eles não sabem o que fazer com a dor que ainda sentem. Eles estão perdidos, se perguntando se aquilo vai durar para sempre. Será que nunca vai sarar? Sempre vai sangrar?
Achei válido colocar um lance vivido por mim descrito acima, pois não teve como não lembrá-lo e principalmente porque achei o comportamento dos casais parecidos. Ela externando a dor o tempo todo, achando – talvez – até um pecado sorrir ou simplesmente seguir em frente. Ele tentando segurar as rédeas da situação, mas no fundo sofrendo tanto ou mais que ela. Aliás, Nicole Kidman foi indicada ao Oscar por esta interpretação, mas quem merecia era Eckhart, sempre competente nos seus papéis.
bonito post, ainda não tive coragem de assistir esse filme e nem sei se terei, mas sei que deve ser uma obra forte e de qualidade.
ResponderExcluirVlw.
http://umanoem365filmes.blogspot.com/
o filme pode até ser legal, mas filho morrendo no cinema já deu hein? 21 gramas narra uma perda ainda maior além de abordar outros temas, o quarto do filho também carrega este drama e um pouco lá atrás short cuts.
ResponderExcluirabraço
Valmir
Valeu Celo, acho que dá para assistir sem problemas, viu. Depende de como vc está no dia, hehehe.
ResponderExcluirSim, Valmir, tens razão. Outros tantos abortam o mesmo tema. Mas este fica apenas num determinado período, aqueles oito meses.Quando a coisa tá grande e eles estão perdidos. Lembro de não ter gostado de 21 gramas. O Quarto do Filho é espetacular, bem lembrado. De qualquer forma ninguém merece passar por isso né, coisa de louco, eu hein!