27 de janeiro de 2011

Você Vai Conhecer o Homem dos Seus Sonhos - Wood Allen


Geralmente os filmes de Wood Allen nos chegam com grande atraso por causa das distribuidoras. Como exemplo, temos “A Prova de Morte” filme de Tarantino, que chegou aqui com três anos de atraso. Fantástico, não? Sendo assim, acabamos por receber dois filmes de Allen no mesmo ano. Isso acabou sendo bom, pois no começo do ano me deparei com “Tudo Pode Dar Certo”, filmaço do velho mestre, já na lista dos melhores do ano, como há tempos não acontecia.

Essa última comédia relembra Allen na sua melhor forma. Talvez, desde “Desconstruindo Harry”, ele não fazia um filme tão bom. Texto afiado, grandes piadas em série que às vezes fica até difícil acompanhar a velocidade, e aquele seu jeito todo peculiar de filmar, meio até displicente, que acaba tendo aquele charme que só ele consegue, relembrando seus bons tempos, nos idos dos anos 80 e começo de 90, quando era sem dúvida meu diretor favorito.

Eis que, para minha surpresa, no final do ano, aparece outro filme do mestre. Mas com outra pegada, outro ritmo. Na minha modesta opinião “Você Vai Conhecer o Homem dos Seus Sonhos” é vendido erroneamente por aí, parece até uma pegadinha de Allen, para os desavisados. Não existe comédia ali, - talvez alguns sorrisos amarelos- todas as personagens estão à beira do precipício, perdidos em suas vidas. Um pé dentro, outro fora do abismo. Não é uma comédia e sim uma tragédia. Indo na direção contrária ao filme do começo do ano, bem poderia se chamar “Tudo Pode Dar Errado”.

Fui rever outro dia, em minha lenta e dolorosa despedida do cine Belas Artes e um casal à minha frente estava em dúvida sobre qual filme assistir. Um falou ao outro em assistir a este filme, pois queriam se divertir. Deu vontade na hora de falar-lhes que não fossem, pois iriam se arrepender. Certamente, eles devem hoje fazer coro aos muitos que não gostaram do filme, como tenho lido por aí.

Se não me engano, foi no blog do Chico, que li uma crítica ao filme dizendo que os atores estavam inadequados aos seus papéis. Ele até faz comparações com os atores de Hanna e Suas Irmãs. Pois é justamente neste citado erro é que esta o grande acerto do filme. Todos os atores – com exceção ao personagem de Antonio Bandeiras, que parece ser o único a não estar na beira do precipício – não se encaixam com seus personagens. É a inadequação de cada um consigo mesmo, que rege a vida de um por um ali. Maus atores de suas vidas reais. Um bom exemplo é o personagem de Naomi Watts- que arrasa justamente por parecer a mais perdida – que abandona o marido por estar apaixonada pelo patrão e se achar correspondida. Ela recua quando tem que avançar, ou avança quando tem que recuar. Eu bem sei o que é isso, ou se sei!

Allen chega até a brincar – tristemente – com o espiritismo, pois uma de suas personagens, a ótima Gemma Jones, resolve adentrar neste desconhecido mundo a fim de afastar a todo custo a solidão na velhice. Enquanto isso, seu ex-marido, vivido por Anthony Hopkins, resolve rejuvenescer artificialmente, iludido, atrás do tempo perdido, através de pílulas azuis e um novo casamento fadado ao fracasso.

Acho que a personagem que mais me tocou foi a indiana (Freida Pinto) que se envolve com o escritor ladrão e medíocre, vivido por Josh Brolin. Não pelo o que é mostrado no filme, quando ela abre mão de um casamento e dos costumes milenares e familiares, para ficar com ele. Mas pelo que sabemos que acontecerá a ela quando aquele seu castelo de areia certamente cair. Não vemos isso no filme, mas sabemos que fatalmente acontecerá. O filme não acaba ali, muita tristeza e fracasso virão para eles, por suas escolhas errôneas. Onde está a comédia disso tudo? Parece que Wood Allen está atrás da câmera pintado de palhaço triste. Aquelas pessoas estão por aí, passam por nós, estão na fila de cinema, no supermercado, estão em mim, inadequado até os ossos. Tentando por um momento, um pouquinho só que seja se encontrar, na ilusão de ser feliz, e quem sabe retirar a mascara de palhaço triste.

 

20 de janeiro de 2011

Minhas Mães e Meu Pai - Lais Chalodenko


Churrasco na casa de uma amiga, dia quente e muita cerveja rolando. Sento ao lado de um casal de amigas. Bia comenta comigo:


E aí Beto, já assistiu “Minhas Mães e Meu Pai”?

Claro, é muito bom. Annette Bening manda muito bem no filme. Merece o Oscar. Aquela cena dela depois de descobrir os fios de cabelo é fantastisca.

Pois é... Deixa eu te contar uma novidade em primeira mão. Resolvi! No próximo ano terei um filho. Produção independente também. Já tá na hora, acho que tenho estrutura financeira e mental pra segurar a parada.

É mesmo? E o que a Joana acha disso, vocês estão juntas há tempos...

O lance é meu, mas estamos bem resolvidas quanto a isso. Conversamos tudo o que tínhamos para conversar. Sou eu que quero, ela vai ser a “tia”.

E aí, vai fazer o mesmo que as personagens de Juliette e Annette no filme? Viu só a confusão que deu...

Não, não. Apesar de homem ser completamente dispensável, gosto de pinto. Assim, assim...Vou uma noite dessas em que eu me achar fértil e preparada, sair por aí, achar um homem simpático e transar. Eu me garanto, me acho ainda bem gostosa.

Sim, é sim. Entendo.

Eu gosto de pinto, já disse né, mas muito de vez em nunca. Homem é dispensável...

É, você já falou...

Pois é... Pode ser de outro jeito também. Algum amigo... se eu tiver sorte e engravidar, conto para ele, se quiser ajudar é benvindo, senão tá tudo bem, é completamente...

Dispensável (comenta Léa do outro lado da mesa, entrando no meio da conversa), eu também acho. Depois de dois ex-maridos então... Agora, homens na minha vida, só meus dois filhos. Homens são completamentes dispensáveis. Aliás, estou nervosa, vou hoje à noite me encontrar com uma meninha que conheci na minha loja nesta semana. Marcamos para hoje à noite. Aliás Bia, você podia até me dar uns toques né, já que estou adentrando num novo mundo...

Querida, vai tranquila que vai dar tudo certo. É uma coisa de dentro pra fora, como tenta explicar a Juliette para o filho uma certa hora no filme. Não é Beto?

... (eu calado)

Achei bem pertinente. Não da para explicar, é de mulher pra mulher... Olha lá Beto, a churrasqueira, vai queimar...

Ah! Pra isso eu não sou dispensável né?

Ah! Magoei! Você é amiguinho. Não conta. E para certas coisas não. (elas riem e eu saio da mesa menor do que antes).



Usei a histórinha – verídica – acima, para ilustrar o fato desse filme ser tão legal. Sim, legal é o termo certo. Esse filme esta para o ano de 2010, assim como 500 Dias com Ela está para o ano de 2009. É aquele filme, que se não é o melhor do ano, é o mais simpático, o mais “cool”. Quem não assistiu, assista correndo. E sem preconceito.

12 de janeiro de 2011

Além da Vida – Clint Eastwood


Já faz tempo que não escrevo nada no blog, que agora reformado, me traz novamente motivos para tê-lo de novo na minha vida. Nada melhor para este reencontro do que recomeçar com um texto sobre o melhor dos melhores na atualidade. Sim, é ele, herdeiro direto – na minha modéstia opinião – do diretor dos diretores: John Ford. Assim como o mestre antigo, Clint sabe como ninguém contar uma bela história, sem precisar de fantasiosas pirotecnias tridimensionais. Basta talento e simplicidade para se fazer o melhor cinema, falar sobre o ser humano e suas complexidades, como nos antigos filmes americanos que até hoje tanto encantam os cinéfilos pelo mundo afora.
Clint Eastwood é um gênio, o melhor da atualidade, e mais uma vez prova isso mexendo num assunto espinhoso como vida após a morte – assunto tão em moda no cinema brasileiro -, em que outro diretor qualquer escorregaria feio. Mas não ele, que com sutil elegância, bota o assunto em pauta, mas o faz como que se abrissem mais uma porta da percepção, da procura do entendimento, basta a quem quiser adentrá-la ou não.  Maldição ou benção? Vida eterna em outro espaço, ou o vazio escuro da morte total? Depende de como cada enxerga seus limites, e há que respeitá-los.

Eu, particularmente, acho impossível que a vida se resuma a só isso aqui. Que nós, seres humanos burros, que não sabemos (ou podemos) usar sequer dez por cento da nossa cabeça animal (como diria Rauzito), morremos e vivemos pó. Não, isso não. Alma! Mas tudo é uma questão de fé, de acreditar ou não, cada um na sua, com todo o respeito. Belo exemplo é o personagem de Matt Damon neste filme, que vidente que é, acha isso uma maldição, o que para mim seria uma benção.

Um espectador não acostumado com sua obra recente pode se surpreender logo com o inicio do filme. Numa cena de tsunami, que dificilmente haverá cena mais impactante no ano, Clint mostra que sabe como ninguém fazer uma cena de ação só para desenferrujar. É um filme de ação? Não, Clint no alto dos seus oitenta anos de idade, lentamente adentra novamente no universo complicado das relações humanas; da morte e principalmente da solidão. Temas tão recorrentes na sua espetacular obra recente. Parece que com este filme, Clint completa uma trilogia que começou com suas duas últimas obras-primas: Menina de Ouro e depois com Gran Torino.

São três personagens distintos e distantes que sabemos que uma hora se encontrarão (que o mundo virtual mostra não ser tão distante assim) de três países diferentes que em comum, sofrem com algum tipo de experiência pós-morte. A francesa jornalista, que depois do terremoto no qual quase morreu, percebe que seu mundo de sucesso desmorona; O garoto inglês que perde o irmão gêmeo, seu alicerce diante de uma família totalmente desestruturada; O vidente americano que acha que seu dom é uma maldição e por isso vive isolado e solitário. Corta o coração suas refeições solitárias e a noturna companhia de Dickens. A solidão é comum a todos.

Mais uma vez é nesse ponto crítico da vida moderna que Clint quer se ater, mesmo que use o tema de pós-vida como elo entre eles, pois independente do que acontece depois da morte, o que realmente importa é o agora, o que fazemos no hoje em nossas vidas. É impressionante como a solidão tem permeado os filmes do velho Clint. Seu olhar clínico nos mostrando o mundo de uma maneira geral, e a solidão das pessoas dessas capitais. Quanto mais a tecnologia faz o mundo menor, parece que é maior a distância entre as pessoas. Revendo outro dia Menina de Ouro, percebi que o grande ganho da boxeadora não foram as lutas e sim a amizade de seu técnico e vice versa, o prazer único de pelo menos uma vez na vida saborearem um pedaço de torta de limão juntos. Um momento de amor e sinceridade compartilhado de igual pra igual. Não seria isso o que procuramos o tempo todo?

A vida é difícil amigo, tudo é complicado (Porque complicamos? Porque dificultamos?) e nós sempre temos que ir num determinado caminho, seguir em frente, apesar de tantos descaminhos. Talvez seja por isso que estou de volta ao mundo dos blogues, uma corda no barranco, no abismo. Talvez me matricule também num curso de culinária como o personagem de Damon, atrás de uma boca sensual a querer experimentar iguarias, talvez saia por aí berrando minhas dores. Nem sei. Por enquanto escrevo aqui, escuto músicas, falo com os poucos amigos cada vez mais distantes. Vivo o grande escândalo (como diria Caetano) de estar aqui só. Bebendo demais, amando de menos, mas sempre com esperanças de alterar a equação. E também assisto e agradeço a elegância do velho mestre do cinema, torcendo para que ele tenha vida longa como o outro velho Manuel de Oliveira, português cineasta ainda ativo aos cem anos, pois compartilhamos igualmente o amor pelo cinema, pelos belos filmes. E eu esteja vivo, seja lá onde quer que seja para apreciar seus belos exemplos dessas maravilhas cheias de elegância e beleza que criam. Salve! Salve o cinema!