15 de março de 2011

Bruna Surfistinha – Marcus Baldini





Você assistiria a um filme pornô, e ao mesmo tempo, comeria um prato de comida caseira enquanto assiste ao dito filme? Fiz-me está pergunta enquanto apreciava a um piratinha pornô da Bruna Surfistinha, a verdadeira. Na realidade acho filme pornô muito triste. Sério. Uma punheta mal dada. Fico imaginando, quando o diretor diz: “Goza!”, ou melhor, diz: “Corta!”. Deve dar uma sensação de vazio naquele povo... Bem, coisas bobas de um romântico antiquado solitário, que sou sim, e ponto. Mas estou fugindo do assunto. Fiz questão de assistir ao filme da Bruna real, para depois assistir ao tão afamado, e já sucesso comercial que é o filme estrelado pela corajosa Débora Secco. Existe uma coisa em comum entre os dois filmes. Tem aquela cena em que Débora olha diretamente para a câmera, na sua primeira relação amorosa do filme, e parece estar alheia, em outra dimensão, com aquilo que está acontecendo. O mesmo acontece com a Bruna real, quando está em plena orgia em suas cenas explícitas. Nós a vemos, mas parece que não está ali, naquele corpo suado, uma espécie de piloto automático. Só falta fazer as unhas, enquanto alguns rapazes preenchem todos seus orifícios disponíveis. Incríveis em como as pessoas conseguem chegar a tais níveis em suas vidas.

Mas logo acima falei da coragem de Débora Secco, mas apesar de sua entrega ao papel e reconhecido talento e beleza, não foi preciso tanta coragem assim, afinal de contas, logo quando eu soube que seria ela que estrelaria ao filme, pensei que o mesmo não seria tão “quente” quanto acho que deveria ser que eu gostaria. Seria outro tipo de coragem. De quebrar as regras do já viciado novo cinema nacional, com sua patente Globo Filmes, tão marcada entre as novas produções. É o preço do sucesso comercial, que obviamente o filme está tendo de sobra. Mas cadê a ousadia? Cadê o frescor e o peso, de uma obra que se mostra menor do que de fato poderia ser. Uma grande história, num filme menor do que ela, para agradar a todo o público e não indignar as moçoilas de família. Faz me rir.

A história é até bem contada, tudo é limpo, higienizado. Tudo certinho. E quando parece que alguma cena vai nos arrebatar, lá vem o diretor (de publicidade, é claro, em seu primeiro longa-metragem) e bota tudo nos eixos. Afinal, não se pode assustar o grande público. Uma cena em especial, me chama a atenção, é quando Bruna está em plena decadência e aceita transar por qualquer 10 paus (literalmente) num puteiro de décima categoria. Faltou coragem para ali, Débora expor seu corpo, ou mesmo o diretor mostrar um pouco da podridão emocional de um lugar como aquele, mesmo ali é tudo bonitinho no filme. Quem já esteve (como eu) num daqueles inferninhos da Rua Augusta - estão acabando aos poucos com eles, em nome dos bares modernetes, já repararam?- sabe como é o ambiente moribundo desses locais, o ar é pesado, quase dá para pegar, e há um cheiro de porra e eucalipto em tudo, que pega na gente por dias. Uma espécie de umbral sexual, que caras, ou garotos na puberdade (como eu há anos atrás) acham até charmoso. Mas na verdade, deve ser, e é tudo muito triste.

Parabéns Débora Secco, parabéns diretor e produtores desse sucesso cinematográfico nacional. Agora é só esperar para assistir ao filme novamente na televisão. Quem sabe até, daqui a uns três ou quatro anos, poderemos assistir Bruna Surfistinha nas reprises das tardes, ou melhor, na sessão da tarde da Rede Globo. Sim, logo, logo, vou rever este filme na sessão da tarde. Tá faltando coragem no cinema nacional.

11 de março de 2011

Em Um Mundo Melhor - Sussane Bier


Logo no inicio do filme vemos um médico chegando a um povoado africano onde crianças sorridentes e miseráveis correm atrás de seu veículo, atrás de um brinde qualquer. Ganham uma bola e ficam satisfeitos. Em seguida vemos um garoto em outro continente, com outro nível de vida, totalmente triste, e pior, seu semblante carrega uma raiva desproporcional para uma criança, raiva pela morte de sua mãe e por achar que seu pai, que por outro lado, carrega uma angústia terrível o tempo todo, não fez o possível para salva-la. Dois mundos totalmente diferentes e interligados por aquele médico, como veremos em seguida. Vemos logo após que, ajudando todos aqueles necessitados, o mesmo médico se vê perdendo sua família devido à constante distância entre eles. Numa discussão com a esposa, que o está deixando, ele diz que se sente perdido. Uma frase síntese para denotar o que aquele homem passa vendo toda aquela violência sem precedentes, diante de sua índole pacifista.

A violência, seja física ou moral, permeia a história de todos os personagens neste filme difícil e belo. A talentosa diretora do ótimo “Depois do Casamento” nos brinda com um dos melhores filmes do ano, já ganhador do Oscar de filme estrangeiro. Dificilmente haveria concorrente à altura para ele. Este é um filme cheio de sutilezas, arestas e portas abertas, diante da dificuldade de (sobre) viver entre dores, amores, culpas e ressentimentos, seja num país miserável, seja num país de primeiro mundo, entre os mais ricos do mundo. Onde aparentemente não deveria haver problemas. Um filme que precisa de um olhar atento, ou melhor, uma segunda espiada diante de personagens tão complexos.

Numa cena, entre tantas tão emblemáticas, vemos aquele mesmo médico sendo esbofeteado na cara, na frente dos filhos. Querendo provar seu pacifismo, ele não reage, se apequena aos nossos olhos, aos olhos dos filhos, se apequena. E depois ainda levo outros bofetões e continua a não reagir e ainda diz que não dói aos filhos. Quem em são consciência faria isso, que parece ser a maior humilhação a que uma pessoa possa passar? Ainda mais na frente de outros a quem você deve servir de exemplo. Mas o que é um bofetão na cara, diante daquilo que ele vê acontecer com aquelas mulheres mutiladas e humilhadas que ele constantemente salva na África? A violência e ira que nasce no menino bem criado seria a mesma violência do “Machão” (mutilador de mulheres) africano?

O ser-humano é feito de várias camadas de amor, acúmulos de dor, raiva, esperanças, ressentimentos, e tantos outros sentimentos que se acumulam e nos fazem ser quem somos. A construção desse ser ,único, e seu convívio com todos os outros faz nossa vida rica e misteriosa. É sempre uma construção, seja aonde for, de aprender a viver e conviver com nossos próximos.

Sussane Bier parece querer nos mostrar nesse filme maravilhoso, que além de termos uma índole violenta pronta para explodir, temos muitas arestas em nossas vidas a serem trabalhadas e até digeridas por nós mesmos. O homem é o lobo do homem, e infelizmente vai continuar sendo assim por um bom – mal – tempo. Seja no Haiti, seja em Paris. Aprender, para vivermos em um mundo melhor.