9 de maio de 2012

Paraísos Artificiais – Marco Dutra



-Vá numa Rave, mas não me chame!
Tem certas coisas que não consigo aguentar, e não importa se com isso estou sendo velho, burro ou antiquado. Eu me imaginar numa festa destas com aquele “putz-putz”  por mais de cinco minutos no meu ouvido, me parece até pior do que um “Segura peão!” interminável. Odeio música eletrônica. Aquela historinha de que tal dj vai tocar em tal lugar, faz-me rir. Ou seja mesmo uma hora, escutando aqueles tais funks cariocas (funk para mim é outra coisa) é impensável. Não é questão de ser velho, é questão de bom senso. E nem me venham dizer que funk carioca é a personificação dos morros, é a voz do povo e tal. É sim a mistura de grosseria, ignorância e vulgaridade, enfim...
Mas o cinema acaba abrindo portas para você conhecer coisas que por vezes, por si só, você não abriria ou conheceria. Quando vi o trailer deste filme, sua temática e atores. Achei que iria passar longe, muito longe da sala de cinema. Mas lendo um negócio a respeito aqui, outro ali, acabei achando que deveria assistir ao filme, o que acabou se revelando uma boa surpresa. É bom quando você não espera nada e saí surpreendido.
Gostei do filme, precisava mesmo de um filme que retratasse este mundo. Achei bem conduzido e me fez conhecer um pouco deste lado do mundo da música eletrônica, dos jovens que curtem estas baladas e tal. Aquela história de drogas sintéticas, eu já imaginava que era aquilo tudo mesmo. Eu ainda sou do tempo dos baseadinhos. Mas na verdade a história sempre se repete, só mudam os estilos, não é? Ou seja, jovens a procura de rumo na vida, querendo abraçar com toda a volúpia e vontade o mundo. Experimentar sem medo, com intensidade. Mas é claro que como antes ou hoje, tudo tem seu preço, basta saber se queremos pagar o que a coisa toda pode pedir. Toda a história do filme, é permeada pelas drogas, e todos de um modo geral, acabam perdendo muito pelo envolvimento com as mesmas. Mas o legal do filme, que mesmo assim ele não quer passar nenhum tipo de lição de moral.
O tempo no filme se  passe em três períodos distintos, cada um tendo como pano de fundo uma cidade (Rio, Amsterdã e Litoral Pernambucano) diferente. É a história do envolvimento de Erika (Nathalia Dill) e Nando (Luca Bianchi) e o que acontece com eles em cada tempo e cidade. As idas e vindas no tempo são muito bem editadas no filme e serve para deixa-lo agradável de assistir, apesar da insistente música eletrônica, mas até aí tem quem goste. O ponto alto é a presença marcante de Nathalia Dill, que destoa com sua beleza e talento de um grupo irregular de atores. E, deus meu, que seios!

4 de maio de 2012

Raul- O Inicio o Fim e o Meio – Walter Carvalho



Assistir a este filme me fez lembrar a minha relação com Raul, com meu pai, da minha infância já distante e como tudo se confunde na minha cabeça.
Desconfiado, fui a casa daquele que seria meu padrasto e o grande homem de minha vida. Ele queria me agradar, me conquistar, pois era eu, o filho de sua futura mulher, e eu moleque de tudo, só estava acostumado a escutar os discos do Roberto Carlos e no máximo, trilhas de novela. Mas eis que ele me surge com sua coleção de bolachões do Raul, e com um disco novinho em folha com o dizer “censurado”, era  o rock das aranhas que acabará de sair.” Fecha a porta, abre a porta, abre-te sésamo”, literalmente. Hoje, arrependido é claro, só guardo da minha vasta coleção de discos que um dia eu tive, aqueles mesmos vinis, tesouros afetivos que herdei, maltratados pelo uso contínuo de um moleque querendo descobrir o mundo com suas metamorfoses. Um belo dia, adolescente de tudo, época  “DaLata”, eu já espinhudo, sou chamado no quarto por este mesmo pai, que encontrará, num casaco que achei ser meu, mas na verdade era dele, um presentinho que havia ganho de um amigo. “É sempre a mesma batalha por um cigarro de palha/Navio de cruzar deserto”. Conversa difícil, onde fiquei por um bom tempo versando ditos e letras de Raul, para me explicar, mas no final com a promessa de não aparecer mais com “aquilo” em casa e na minha vida, acabei convencendo ele (será?) que ele até que era o culpado (veja só), pois tinha me apresentado o tal “Maluco Beleza” com suas filosofias hippies alternativas, que aquilo era contestador e tal e coisa. Balela que ele fingiu acreditar e eu fingi que tinha razão. Outros tempos, outras formas de ver as coisas. Mas algo inesquecível, pois foi uma de nossas conversas mais interessantes.

Tempos depois, me vejo na casa de shows Olímpia, onde Raul Seixas, juntamente com Marcelo Nova, fez aquele que seria seu último show em São Paulo. Casa lotada de “adoradores” que a cada gemido emitido por Raul entravam em delírio, mas eu que fiquei bem próximo ao palco, fiquei foi muito triste, por ver de perto aquele declínio de homem totalmente inchado pela bebida e pela vida que se esvaía a olho nu. Raul não cantava, só balbuciava palavras, enquanto Marcelo Nova segurava as pontas como podia, com sincera admiração e respeito pelo “mestre” que dividia o palco com ele. Alias, sou da turma que acha que Marcelo Nova, fez bem ao Raul,  ele não quis se aproveitar, mas sim ajudar Raul a ter uma sobrevida, conseguida com aquele disco “Panela do Diabo” e turnê em conjunto. Ganhou com isso, é claro que sim, mas a impressão que tive foi de quem mais ganhou foi o próprio Raúl que estava encostado, esquecido e sem contrato com gravadora alguma, já quase morto, isso é fato. Algum tempo depois, tive mais um “encontro” com Raul Seixas, coisa de dias antes de sua morte, estava eu e mais um amigo - acho que era o Cássio - subindo a Rua Augusta, quando paramos na lanchonete Aldeia (reformada, existe até hoje) e lá estava aquele trapo de gente encostado tomando seu uísque, quase não reconheci, mas nem quis ficar olhando, pois aquele não era, nem de longe o “Moleque Maravilhoso”. Dias depois que ele morreu, fiquei sabendo que de fato ele sempre estava naquele bar, pois morava na Rua Frei Caneca, bem próximo aquele local. Onde morreu inchado, sem fãs e sozinho.
Portanto, é difícil falar sobre este filme, que por trazer imagens inéditas e se dedicar a homenagear “Rauzito” já ganha todos os méritos possíveis. Mas algumas coisas no filme chamam a atenção por mal ou por bem. Surpresa boa foi o “arroz de festa” Caetano Veloso, prestar uma bela homenagem declarando “Ouro de Tolo”. Ou mesmo a bem humorada entrevista de Paulo Coelho. Acho que deveriam dar mais atenção ao outro grande parceiro Claudio Roberto ( na foto acima com Raul), pois se percebe claramente que continua sendo o “Maluco Beleza” que escreveu a letra de outro clássico. Por outro lado, a cenas dispensáveis, como a empregada sobe ao apartamento em que Raul morreu, ela falando que nunca tinha visto ele bêbado, chega até a ser engraçado. Como dizia Raúl: Quando acabar o maluco sou eu! Faltou também um musical inteiro com ele em plena forma, Walter Carvalho não deixa uma música sequer tocar inteira, privilegiando o tempo todo os depoimentos, uma pena.
Conheço muita gente que torce o nariz para ele, e chega a gemer de raiva, quando em algum lugar, seja bar, praia ou praça escuta: Toca Raul! Mas mesmo estes, se derem oportunidade a si mesmos, de assistirem a este documentário, darão conta da genialidade que havia por trás daquele homem indecifrável. Uma verdadeira metamorfose ambulante, sempre a caminho do caos, do amor e da dor, enquanto esperava pelo trem das sete horas, o último do sertão.
Com carinho, de mais um Cachorro Urubu.