28 de fevereiro de 2007

Antonia – Tata Amaral

Foi preciso uma segunda sessão do filme de Tata Amaral para algumas coisas ficarem claras para mim.Algumas impressões mudaram, outras permaneceram, mas no final das contas, o resultado foi positivo.

O grande mérito de Antonia é fugir dos estereótipos que sempre cercam filmes nacionais que falam das baixas rendas. Esse é o grande mérito. O defeito foi seu final abrupto, e a pouca explicação sobre cada uma das personagens principais. O filme merecia um tempo maior, me pareceu tudo muito apressado, e isso atrapalhou muito seu andamento.

Suas meninas sonham com um futuro melhor através da música, mas a realidade da força da grana que ergue e destrói coisas belas (com a licença de Caetano), afundam seus sonhos a cada dia. O cotidiano duro daquelas mulheres guerreiras sempre é posto a prova, seja pela maternidade, pelo preconceito ou outras dificuldades de quem tem pouco, ou quase nada, seja materialmente ou emocionalmente.

Duas cenas me chamam muita atenção, ambas protagonizadas por Preta (Negra Lee). Numa delas, depois de passar a noite no hospital por ver seu amigo ser linchado por preconceito, Preta procura o refúgio dos pais. Encontra a mãe na sala, a cantar cantos evangélicos, e logo após, encontra o pai nos fundos da casa, a descascar uma laranja. Ela não encontra o tão esperado abrigo. Fica em silencio, sem forças nem para falar o que lhe aconteceu. É a incomunicabilidade tão alardeada em tantos outros filmes, que encontra exemplos nos morros da Brasilândia (bairro periférico da zona norte em SP). A outra cena, é quando Preta caminha sozinha para casa, na mão um cachorro-quente, depois de ter cantado a noite inteira música sertaneja, num bar à cata de alguns trocados. Sua esperança se esvai, pois neste momento ela está só, o grupo havia se desmanchado. Seu caminhar é doído e quase derrotado, como daquelas pessoas que lutam muito para ver seus sonhos vivos, mas só encontra desilusão, ao fundo o morro feio (e lindo) da Brasilândia.

Outro mérito do filme, é se utilizar de atores que não são profissionais e sim que entendem e já vivenciaram toda aquela situação, sendo Negra Lee, inclusive, moradora do próprio bairro em que a história se passa. Mas são Thaíde e Leilah Moreno que roubam a cena.

É impressionante, como nesses bairros pobres, a construção das casas evoca este tipo de coisa, ou seja, a eterna construção de uma vida melhor.Como as pessoas que ali habitam, que lutam por uma vida mais digna em ambiente tão hostil e difícil. Suas casas sempre estão por fazer, sem acabamento. Assim como suas casas, as pessoas sentem suas vidas sempre em construção, sem o fino acabamento que toda casa merece, só que com elas a falta é de estrutura, saúde e educação de base.

Antonia não é bonitinho, nem fácil de se assistir, trata a periferia sem maquiagem, mas também (e ainda bem) sem pena. Não está fazendo o sucesso que todos achavam que iria fazer, e por incrível que pareça, este sucesso não foi alcançado justamente pelas qualidades que o filme tem de não se entregar ao melodrama fácil, e sim mostrar uma realidade dura e que passa longe dos shoppings e das pessoas que costumam freqüentar seus cinemas. É um filme que futuramente vai ser mais bem compreendido. Tata Amaral não chega a mostrar a força dura e seca de seu primeiro filme, a obra-prima “Um Céu de Estrelas”, que se passa nos escombros das antigas fábricas do bairro da Mooca. Mas é extremamente honesta e amorosa com seu filme e com suas Antonias. A diretora, assim como suas personagens acreditam num futuro melhor, apesar de toda a maré da vida estar contra. Torçamos por elas.

22 de fevereiro de 2007

Cassino – Martin Scorsese

Li no jornal, logo após o término do carnaval, sobre um grande barracão feito na Sapucaí, pelos “padrinhos” das escolas de samba, para poderem todos construir seus carros alegóricos por lá. Grande iniciativa, que ajuda ainda mais o carnaval do Rio de Janeiro ser o que é. Quer se goste ou não, é de se admirar tanto trabalho e beleza.Estes “padrinhos” benfeitores, são na verdade contraventores de (no mínimo) jogo do bicho, atividade ilegal, que certamente ajuda na violência da cidade maravilhosa, mas que na época de carnaval ganha outros relevos, e de contraventores eles passam a ser benfeitores de suas comunidades.

Digo isto para fazer uma ponte entre os bicheiros e os cassinos de Las Vegas nos idos dos anos setenta. Tanto é que num momento do filme, Sam Ace (Robert De Niro) se diz surpreso, pois em outros estados dos EUA, ele é considerado inimigo público, um contraventor sempre as voltas com a polícia e as grades das prisões, enquanto em Las Vegas, ele era um semi-deus, admirado e adorado por sua habilidade com a jogatina.No filme ele é o administrador de um grande cassino, onde todos perdem dinheiro, menos o próprio cassino, que faturava milhões para a máfia na época.

Filme baseado numa história verídica, que na época em que passou no cinema, assisti e não curti muito. Resolvi rever este filme de Scorsese em pleno carnaval. Até porque todo e qualquer filme do genial diretor, sempre fica melhor na revisão, e com este não foi diferente.Já valeria a pena, só por assistir ao papel da vida de Sharon Stone e por ser os últimos grandes personagens de Robert De Niro e Joe Pesci. Ou alguém duvida? O filme gira em torno dos personagens Sam Ace (De Niro), Nicky (Pesci) e Ginger (Stone). E acompanhamos um show de direção e dinamismo por parte de Scorsese, que nos mostra ricamente, como funcionava aquele complexo mundo de jogos e falsos valores.

Retrato de uma América fadada ao fracasso por uma ambição desmedida, onde o dinheiro é a mola mestra, que passa por cima de todos os princípios do homem. O dinheiro fácil que rolava (e continua a rolar) na cidade mundial do jogo, também trazia suas contra-indicações. E Scorsese nos mostra claramente o apogeu e o declínio de seus personagens. E este declínio se inicia com o amor de Sam por Ginger. Ele, que tinha tudo sobre controle até então, se apaixona à primeira vista por Ginger e seu mundo aos poucos vai desmoronando.

O que não tinha percebido da primeira vez que havia assistido ao filme, e dessa vez ficou claro, é que este filme é de amor. Uma longe é linda história de amor, que obviamente, não deu certo. Sam, em certo momento, diz a Ginger que tudo o que ele tem não vale nada, e que a única coisa que lhe importa é a certeza que quer ter, de que pode confiar sua vida a sua amada, e que o resto é bobagem. Mas como querer um amor puro em meio a um mar de ganâncias e luxurias? Como conseguir manter um sentimento limpo e cristalino em meio à lama do dinheiro e da contravenção?

Com um show de Sharon Stone – que praticamente obrigou Scorsese a te-la no filme, já que este queria Madonna – que vive a complexa Ginger, prostituta de luxo, que tem pleno domínio de qualquer homem, menos de seu cafetão Lester (James Woods). Com o casamento, ela até tenta virar uma dona de casa, mas mesmo com seu marido dando tudo a ela, Ginger se sente cada vez mais infeliz. Acaba se envolvendo com o melhor amigo de seu marido, o bandidão Nicky. E as conseqüências são desastrosas. É tocante o quanto Sam Ace ama sua esposa, e mesmo vendo o quanto às coisas dão errado, ele nunca desiste de seu amor, fadado ao fracasso.

Scorsese nos mostra com um primor ímpar, aqueles anos não tão distantes, em que a máfia ainda dominava Las Vegas e suas casas de apostas. E mais ainda, nos mostra um de seus filmes mais românticos . Talvez, uma metáfora de um país que deseja ganhar o mundo, que deseja ganhar sempre mais e mais com suas guerras e seu poderio de armas, e seu amplo domínio capitalista mundo afora. Mas dá para ganhar o mundo (money, money) e assim mesmo manter uma pureza de sentimentos? O diretor nos brinda com um retrato nada otimista de seu país, e olha que na época nem havia ainda um cara chamado George Bush. Um grande filme, de um grande diretor. Imperdível.



16 de fevereiro de 2007

Mais Estranho Que a Ficção – Marc Forster


Harold Crick leva sua vida de maneira sistemática, todos seus passos são cronometricos, comandados pelo click do relógio, seus hábitos diários não sofrem nunca um revés. Ele é um fiscal do imposto de renda, portanto, uma pessoa odiada por todos que são procurados por ele. Leva uma vida solitária e sem nuances. Até que um dia ele vai cobrar o imposto atrasado de uma padeira tatuada, e algo novo acontece, um sentimento novo começa a brotar naquela vidinha opaca e sem graça. Num belo dia ela prepara alguns biscoitos e oferece a ele, que diz não gostar. Experimenta e vê que na verdade gosta e muito daquilo, novas sensações apareceram dali, culminando na cena mais bonita do filme, aquela que vale a pena assistir ao filme.

Na sua corajosa paquera, Harold é convidado a entrar na casa da padeira tatuada. Encontra um violão no sofá, ele só sabe dois acordes, timidamente tenta tocar a única música que sabe. Seu sonho era tocar guitarra, mas foi mais um dos muitos sonhos abandonados pelo meio do caminho, por aquele cotidiano . Ele começa a tocar, fecha os olhos e canta timidamente, seus dois acordes ressoam como uma porta aberta para a descoberta de si mesmo. Como se alguma coisa guardada há tempos dentro dele quisesse sair. É o amor!Ana Pascal (a tatuada) observa de longe, vai se chegando e quando ele termina sua canção ela lhe presenteia com um belo beijo na boca. A partir dali sua vida toma um sentido, ele se sente vivo, muito vivo... Apesar de saber que esta preste a morrer.

Todo o resto do filme é perfumaria. Ele sabe que vai morrer porque escuta uma famosa escritora (Emma Thompson) descrever sua vida, só ele a escuta, dentro da sua própria cabeça. A escritora tem por costume, matar seus personagens em todos seus livros, que por sinal fazem muito sucesso. Nisto ele procura ajuda de um professor literário (Dustin Hoffman) para tentar reverter esta situação.

Contando com um elenco de peso, e um roteiro que procura ser uma cópia (mal feita) dos roteiros do esquisito Charles Kauffman , o filme se perde nos outros momentos em que Will Ferrell e Maggie Gyllenhaal não estão juntos em cena. Tudo soa despropositado e insosso. Até mesmo à vontade de Ferrell se mostrar um ator sério. A mensagem no final do filme, quer fazer crer que nenhuma obra artística vale a vida de qualquer ser humano, mas faltou um roteiro e uma direção com moral para mostrar isso de maneira satisfatória.

15 de fevereiro de 2007

Dias de Glória – Rachid Bouchared


A Revolução Francesa nos trouxe uma nova era. E seus princípios e lema (liberdade, igualdade e fraternidade) se alastraram, desde o final do século XVIII, sobre todo o ocidente e serviram de guia para a democracia em que (acho) vivemos. Digo isto, pois seria certo a França nos passar o exemplo de como estes ideais devem ser inseridos na sociedade, de maneira geral.Acontece que nada parece ser o que é. E filmes como este nos confirmam esta tese.

Dias de Glória vem ressaltar a difícil e servil relação da Argélia com a França, isto é, os colonizados com seus colonizadores. Se no ano passado isto foi mostrado às claras, mas no âmbito familiar e restrito, pelo ótimo “Caché” (concorrente ao Alfred de melhor filme) e sua impressionante cena da navalha. Neste também ótimo filme, a questão é colocada, sobre a perspectiva da segunda guerra mundial, onde os colonizados lutavam e morriam pela liberdade de seus colonizadores. Uma difícil situação, totalmente inverossímil, e que aconteceu de fato nos anos de guerra.

Acompanhamos a difícil missão de uma tropa formada pelos colonizados, que procuram entrar na briga, de frente com o poderia alemão. Fica claro que os argelinos eram uma espécie de peões,como no jogo de xadrez. Ou seja, os primeiros a entrar na linha de tiro, à troca de uns míseros trocados e promessas falsas de seus colonizadores por melhores condições de vida. Mas sabemos e vemos que a história foi bem outra, e que na realidade, até hoje, se alastram questões jurídicas a respeito de aposentadoria e direitos a estes bravos e heróicos soldados, sendo que a maioria morreu sem ver seu feito respeitado pela França.

No filme em si, acompanhamos a batalha de quatro soldados e seu sargento chefe – alias, que elenco perfeito - na difícil convivência com os outros soldados, em especial com os superiores franceses. Uma longa luta por sobrevivência e exigência de melhores condições de vida, ou melhor, por respeito e a tal igualdade tão alardeada. Mas tudo é muito difícil, e entre promessas falsas, vemos por exemplo, um soldado apaixonado por uma francesa, que não consegue se comunicar com a amada, porque os “amigos” franceses interceptam suas cartas. De maneira discreta, não querem a “mistura” de raças, mesmo que este lute e ganhe heroicamente, várias batalhas em nome da França.

O que mais chama a atenção, é a forma distinta como tudo é mostrado. Em nenhum momento o filme toma as dores de seus soldados. Tudo é mostrado de maneira sóbria e eficiente, e quem ganha com isso é o público, que tem a oportunidade de assistir a um belo filme. Para mim, particularmente, a grande surpresa do ano, que certamente figurará entre os melhores de 2007.

6 de fevereiro de 2007

Apocalypto – Mel Gibson


É fácil não gostar dos filmes de Mel Gibson. Com exceção do seu primeiro filme, que transborda sensibilidade, todos os outros usam e abusam da violência para mostrarem a que vieram. Logo no seu segundo filme, arrebatou vários Oscar, incluindo o de melhor diretor e ganhou carta branca para fazer o que quisesse. E ele não se fez de rogado, mandou ver no seu “A Paixão de Cristo”, com uma violência incomum, mostrando a todos não só as sete chagas de Cristo, mas todos os seus ferimentos, um por um, no seu calvário até a morte na cruz .Muitos acharam aquilo um verdadeiro exagero, de profundo mal gosto, mas mesmo assim o filme foi um enorme sucesso no mundo inteiro.

No ano passado, ficou mais fácil ainda não gostar do australiano, em meio a uma bebedeira, soltou o verbo e sem freios na língua, falou mal de todo mundo e jogou o seu lado politicamente correto (será que ele alguma vez o teve?) pro ralo. Enquanto outros astros e estrelas não falam uma palavra sem seus assessores aprovarem, Gibson não está nem aí. Ele é conservador demais, e de sua língua não escapam judeus e homossexuais. Mas não são estes “os caras” que comandam Hollywood? Não sei... Só sei que gosto (apesar de não concordar) de seus arroubos etílicos, e principalmente de suas idéias como diretor. Talvez eu seja um dos poucos que gostou de “A Paixão de Cristo”. Na verdade eu gostei muito. Parece-me que Gibson usou seu fervoroso cristianismo para, através do exagero, mostrar a todos nós como somos idiotas. O homem é o próprio lobo do homem. Em cada chaga aberta no corpo de seu Cristo, Gibson parece gritar com sua barriga grande, ao lado de uma garrafa de qualquer bebida forte: “Olha, como somos imbecis. Torturamos e matamos quem veio nos ensinar a amar. Olha como somos imbecis!” E logo depois, caí ao chão bêbado.

Agora ele veio com outra estória absurda, numa língua mais absurda ainda. Em Apocalypto, tenta nos mostrar um pouco sobre a vida dos Maias. Um povo com um senso de arquitetura e construção, avançadíssimos, para sua época. Que desapareceram depois de muitas brigas entre si, em busca de prosperidade, e a custa de muitos sacrifícios humanos,juntamente com a chegada das caravelas pelo mar. Não por acaso, ao avistar uma dessas caravelas, um dos Maias se impressiona com as cruzes que estão logo à frente das embarcações. Ironia de Gibson. Que se no filme anterior louvava o cristianismo, neste seu último filme, mostra claramente, que em nome deste mesmo cristianismo, os brancos foram pouco a pouco acabando com as outras culturas que foram encontrando pela frente. Tudo em nome de Cristo. Esta última cena (desculpe quem ainda não viu), é belíssima, pois com a chegada de “almas tão boas”, percebemos que tudo aquilo a que Jaguar Paw (sua família e suas terras onde sempre caçou) lutou logo morreram.

O homem é o próprio lobo do homem, parece que Gibson quer nos fazer enxergar, que o homem nada mais faz desde tempos idos, que destruir a si mesmo e ao seu próximo. Mesmo com suas boas intenções, seja do homem em si, seja de Gibson, o que resta sempre é a desilusão, e Gibson acha que a única saída é sempre a família. Único porto seguro para um homem evoluir. Certo ou errado, ele pelo menos põe a cara à tapa. Que venham mais erros e acertos de Mel Gibson.

Não gosto muito da direção de Gibson, falta muito nele ainda para se tornar um grande cineasta, mas não nego que gosto das ídeias por traz de seus filmes. E gosto dele como ator, mesmo sendo por vezes canastrão. Alguém tem que falar umas bobagens de vez em quando, para sairmos do marasmo do politicamente correto, que toma de assalto todos os bens comportados por aí. Um porre e umas palavras imbecis de vez em quando não fazem mal a ninguém.

1 de fevereiro de 2007

Relação de filmes - Janeiro de 2007

Filmes assistidos no mês de Janeiro de 2007 por ordem de preferência.




01 – Nacho Libre – Jared Hess (DVD) * * * *

02 – C R A Z Y - Loucos de Amor – Jean Marc Valée * * * *

03 – Pequena Jerusalén – Karin Abou (DVD) * * * *

04 – Babel – Alejandro Gonzalez Inarritu * * *

05 – Anjos do Sol – Rudi Lagemann (DVD) * * *

06 – Apocalypto – Mel Gibson * * *

07 – 800 Balas – Alex de La Iglesias (DVD) * * *

08 – Mais Estranho Que a Ficção – Marc Foster * * *

09 – Diamante de Sangue – Edward Zwick * * *

10 – Deva Vu – Tony Scott * *

11 – Protegida Por Um Anjo – Craig Rosenberg (DVD) * *

12 – Sonhadora – John Gatins (DVD) * *

13 – Uma Noite no Museu – Shawn Levy *