9 de outubro de 2006

Estamira – Marcos Prado


Depois de alguns dias, ainda fica em minha lembrança, umas das cenas finais deste belíssimo filme; A cena em que Estamira diz que o mundo só será purificado e tudo começará do zero, quando se queimar tudo, a começar por ela mesma, que se oferece, caso se, com este gesto, o homem aprender algo. Nisso vemos ela na praia, o mar está bravio, as ondas quebram nas rochas ou entre si, fazendo um bailado de fúria. Como se a água pedisse contas a Estamira, mostrando que tem tão ou mais força que o fogo, pois também é força da natureza, energia que tanto pode ser útil e belo, como pode destruir tudo ou todos a sua volta.

Estamira acredita ser também uma força da natureza, um ser indestrutível, que está acima das coisas pequenas e cotidianas. Ela mora em um barraco e vive de restos de um lixão, mas ela e sua esquizofrenia, parecem passar à margem de todos estes problemas comuns. É apenas uma forma de viver como outra qualquer neste mundo, seu objetivo de vida é muito maior, ela está aqui para: “mostrar a verdade e capturar a mentira”. Ela está aqui para combater o “trocadilo” e os “espertos ao contrário”. Suas frases, sua filosofia, estão acima das dificuldades de sobreviver. Sua suposta “doença” faz com que tenha um relacionamento difícil, com os filhos e com os netos. É no lixão onde freqüenta e trabalha há mais de vinte anos, que se sente bem, mesmo que isso seja incompreensível para os filhos e para o resto do mundo. Seu objetivo é maior, ela precisa combater o “controle remoto”.

Muito se pode discutir a respeito de personagem tão carismático e difícil. Suas atitudes, sua lucidez em meio as suas loucuras. O quando do que ela fala, pode-se levar em consideração ou não. Mas o fato é que Estamira tem um carisma e uma força absurda. Seu discurso é cativante e nos faz querer escutar mais e mais.

Grande mérito de Estamira ser tão “especial”, é do diretor Marcos Prado, sendo dele também a espetacular fotografia do filme (que também pode incomodar a outros). A montagem e a forma como são mostradas as imagens de Estamira, fazem com que sua história, sua loucura, ou o que quer que aquilo seja, ganhe contornos surpreendentes. Nós somos lançados ao seu problemático mundo e mesmo quando ela conversa num idioma “só dela” , conseguimos acompanhá-la.

Estamira é um filme que não procura entender ou se fazer entender. É uma obra em aberto, que nos mostra uma pessoa, uma pérola em meio ao lixão. Uma mulher; mais um ser solitário em meio a um mundo bonito e feio, triste e alegre.Uma pessoa; um mundo rico e pobre de belezas, em meio a tantas incertezas e dúvidas quando ou que e porque de estamos aqui. Estamira é inclassificável, e quem acha que entende o que se passa com ela, é um esperto ao contrário.

3 comentários:

  1. Estamira é uma das figuras mais perturbadoras de que já tive notícias!
    Chegou a entrar no site do filme? Lá (http://www.estamira.com.br/) fiquei sabendo que a origem do documentário foi o fato de Estamira ter dito a Marcos Prado que a missão dele era revelar a missão dela. Foda!
    Beijo.

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  2. Entrei sim, é muito bom. O que acho mais legal neste filme é que além de Estamira ser um personagem fascinante, a forma como o Prado leva o filme, enfim, nos mostra aquela coisa toda é que é foda!Aquela cena dela perto do mar revolto é linda! Um achado!

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  3. Estamira é um maravilhoso documentário da dignidade de uma mulher que em meio ao lixo criado por todos nós, sua loucura e sapiência nos leva a revenrência-la. Brilhante!!!

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