
A câmera é amiga companheira de Ciro (Julio Andrade), um cara totalmente desvinculado de uma vida padrão. Desiludido e apático, ele é o retrato fiel de uma juventude contemporânea que se recusa a crescer, a ter responsabilidades. Que não sabe o que fazer da vida.Tem um pouco de Ciro em mim também, e como tem... Ciro tem um medo danado de se envolver. É um cara legal até, mas afetivamente, é nulo. Até o cachorro que o acompanha, não tem um nome, e ele nem o considera seu.Não quer compromissos de espécie alguma, e enquanto os pais ajudam com uma graninha, vai levando a sua (não) vida.Interessante notar na primeira vez que ele aparece conversando com os pais, o seu total desinteresse. Sei bem como é isso, parece até que eles estão falando outra língua.
A diferença é que na vida dele acontece Marcela (Tainá Muller, linda!!!!!), e sua frágil segurança não suporta o vento do amor brotar dentro de si. Amor que julga nem existir.Que na sua pretensa segurança, pode apenas se manifestar através do sexo. Não é à toa que o sexo (lado de fora), a as doenças (lado de dentro), aparecem tanto no filme (será que é bem no meio dos dois que se encontra o amor?). Através do sexo e das doenças, que Ciro e Marcela se comunicam, se conhecem. Ela tentando a todo custo furar o bloqueio que Ciro criou dentro de si. Bloqueio que se revela frágil, pele exposta e machucada, quando ela se afasta de sua vida. Toda a falsa segurança de Ciro, caiu por terra e ele se vê perdido de amor. Quando Marcela canta – na cena do ano – toda linda e entregue a aquele momento mágico, acompanhada no violão por Ciro, é interessante notar o olhar apaixonado dele para os movimentos dela. Naquele momento, ele se entrega ao amor, mesmo sem saber disso.
Os coadjuvantes são um caso a parte no filme. Seja o moto-boy e a esposa, num encontro na casa deles, que me pareceu a cena mais real e natural eu já vi no cinema. Seja os pais de Ciro, ou mesmo o porteiro pintor. Todos sutilmente, ajudam Ciro a se encontrar afetivamente. Outra cena maravilhosa, de tantas do filme, é quando o pai de Ciro conta a ele um problema que teve no passado, em que teve que se perder para depois se encontrar. Ou quando o porteiro comenta da receita de um sorvete de pêra ocre e gelado, herança de uma ex-namorada, enquanto mostra Marcela em um de seus quadros, colorida e vibrante.
A vida, tão banal aparentemente, pulsa em casa fotograma desta outra pequena obra-prima de Beto Brant. Se já havia ficado maravilhado com “Crime Delicado” no ano passado, filme que junto com “O Céu de Suely” foi pra mim o melhor de 2006. Cão Sem Dono já é até aqui, o filme do ano. Na minha modesta opinião, nunca o cinema brasileiro esteve tão bem representado.
é o filme brasileiro do ano, sem dúvida. pelo menos até Serras da Desordem estrear
ResponderExcluirEstou querendo ver (esse e Ódiquê, do Felipe Joffily), mas não estou encontrando tempo. MInha agenda anda tão assoberbada de coisas que acabo afastando-me da minha paixão pela sétima arte. Mas vou ver... com certeza. Com O Cheiro do Ralo foi a mesma coisa: custei, mas fui ver.
ResponderExcluir(http://claque-te.blogspot.com): Carne Trêmula, de Pedro Almodóvar.
Roberto,
ResponderExcluirArrume um tempinho e não perca "Cão Sem Dono" e "Não Por Acaso".Não perca! Nem que sejam os únicos do ano, hein.
Valeu a visita,
Esta parte da Tainá cantando... Meu olhar, na poltrona do Cinesesc, ficou igual ao do personagem que tocava o violão.
ResponderExcluirTão bom, sair do cinema realmente tocado por um filme...
É verdade Alê. Um momento mágico, de quem é apaixonado por cinema, como nós.
ResponderExcluirFiquei arrepiado lendo o teu texto e me lembrando das partes do filme que vc cita, Beto. Impressionante esse filme. De uma beleza ímpar mesmo. E como a Tainá é apaixonante!
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